Nos anos 80 em Lisboa, não existia o Largo do Intendente nem o Cais do Sodré tal e qual os conhecemos hoje, e o Bairro Alto era mesmo o palco mais mexido da noite alfacinha. E todos, sem exceção, iam lá parar, de políticos a intelectuais, de modernos a alternativos.
Em 1982, abriu, na Rua da Atalaia, um bar com uma pista de dança, que viria a marcar toda uma geração, o Frágil! Aqui juntavam-se artistas, professores e alunos, cineastas, cantores, atores, designers, jornalistas.
E porque é que o Frágil tinha todo esse sucesso? Porque era desses sítios feitos pelas pessoas.
Figuras como a Margarida Martins (antiga Presidente da Junta de Freguesia de Arroios) e Minda Fonseca foram algumas das caras conhecidas que ficavam à porta para decidir quem é que poderia entrar e quem é que teria de ir pregar noutra freguesia.
Além das famosas porteiras, o DJ Leonaldo de Almeida, o “Nanau”, era quem embalava aqueles hits todos da década mais musical de sempre.
Nota de redação: ter sido DJ nos anos 80 em Lisboa deve ter sido tão bom!
Da Atalaia ao Diário de Notícias, a malta da época também dançava no Três Pastorinhos, Artis ou no Bar Bairro Alto.
Na mesma altura, no Príncipe Real aparecia a primeira discoteca assumidamente gay, o Trump’s.
Ali perto, uns anos depois, surgia também o Incógnito com música mais alternativa e indie-rock para um público mais eclético.
Por sua vez, A Lontra começava a ganhar fama pelos seus ritmos africanos até de manhã.
E já no final dos anos 80, começaram a aparecer os grandes clubs já com um “pezinho” de dança para o techno e house, que caracterizou a década seguinte.
Assim surgiu em Lisboa um novo eixo noturno, com as discotecas Plateau, Kremlin e Alcântara-Mar.
Mas convenhamos, há coisas que nunca vão mudar, e antes de qualquer pé de dança há que forrar bem o estômago.
Onde se comia nos anos 80 em Lisboa?
Na altura, os restaurantes mais badalados eram o Bota Alta, Alfaia, Fidalgo, 1º de Maio, A Primavera, Atalaia, Pap’Açorda, Pile ou Face, Casanostra, Bichano, Tasca do Manel, Baiuca ou El Ultimo Tango.
Sem dúvida, o Pap’Açorda era o mais movimentado. Aberto desde 1981, fechou as suas portas em meados de 2016.
Não foi bem fechar, mudou-se uns metros mais para baixo e hoje em dia está no Mercado da Ribeira.
Enquanto esteve na Rua da Atalaia, era mais do que um restaurante. Era um ponto de encontro, era o sítio perfeito para iniciar a noite e para beber um café para dar energia para as próximas horas.
Agora se achas que a indignação da população sobre o fecho de lojas históricas vem de hoje, enganas-te.
É que na altura, apesar de não existir a palavra gentrificação, já se reclamava do mesmo.
Quando a Leitaria Garret fechou, houve até obituário no jornal e uma coroa fúnebre contra a “desumanização” do Chiado, como conta o tão completo livro LX 80 da Dom Quixote.
Este livro não dá apenas detalhes da noite lisboeta, mas fala também sobre a importância dessa década, logo após a liberdade, na definição daquilo que é hoje em dia a Lisboa que todos nós conhecemos!
Alguns dados curiosos extraídos do livro:
- Portugal tinha 9.766,300 residentes, dos quais apenas 0,5% eram estrangeiros
- As mulheres tinham o primeiro filho aos 23,6 anos
- José Cid ganhou o festival RTP da canção com “Um grande, grande amor” e alcançou o sétimo lugar na Eurovisão
- Portugal tinha cerca de 420 cinemas, e o total de espectáculos de música e variedades pouco passava dos 500 num ano