Depois da pandemia, e agora com as guerras na Ucrânia e na Palestina, vivemos tempos de grande incerteza, e em que pouco sabemos onde isto vai parar.
Nunca a saudade foi tão apertada. Nem sempre podemos estar com a nossa família ou com os nossos amigos.
Mas a saudade não se explica, sente-se! E hoje, todos os portugueses a sentem da mesma maneira e com a mesma intensidade.
Este é também um tema recorrente na literatura portuguesa, seja prosa ou poesia. Hoje, por ser Dia Mundial da Poesia, partilhamos alguns poemas sobre a saudade.
A saudade é um sentimento único e tão bonito. O fato de sentirmos saudade significa que vivemos. E que temos algo bom à nossa espera quando tudo isto passar.
Junta-te e (re)lê estes poemas portugueses connosco:
Espero, de Sophia de Mello Breyner Andresen
Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.
Minha Terra, de Florbela Espanca
A. J. Emídio Amaro
Ó minha terra na planicie rasa,
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viu o mar
Onde tenho o meu pâo e a minha casa…
Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folha… a dormitar…
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra mourisca a arder em brasa!
Minha terra onde meu irmâo nasceu…
Aonde a mâe que eu tive e que morreu,
Foi moça e loira, amou e foi amada…
Truz… truz… truz… Eu não tenho onde me acoite,
Sou um pobre de longe, é quase noite…
Terra, quero dormir… dá-me pousada!
Quis Deixar-me A Que Eu Adoro, de Luíz Vaz de Camões
Apartava-se Nise de Montano,
Em cuja alma, partindo-se, ficava,
Que o pastor na memória a debuxava,
Por poder sustentar-se deste engano.
Por ũa praia do Índico Oceano
Sobre o curvo cajado se encostava,
E os olhos pelas águas alongava,
Que pouco se doíam de seu dano.
Pois com tamanha mágoa e saudade,
(Dizia) quis deixar-me a que eu adoro,
Por testemunhas tomo céu e estrelas.
Mas se em vós, ondas, mora piedade,
Levai também as lágrimas que choro,
Pois assim me levais a causa delas.
Saudade, de Mia Couto
Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo tua sombra, teu desejo
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono
Fímbria de Melancolia, de Vergílio Ferreira
Fímbria de melancolia,
memória incerta da dor,
ouço-a no gravador,
no fado que não se ouvia
quando ouvia o seu clamor.
Porque era já no passado
o presente dessa hora
e que me ressoa agora
a um outro mais alongado.
Assim a dor que se sente
no outro obscuro de nós
nunca fala a nossa voz
mas de quem de nós ausente,
só a nós próprios consente
quando não estamos nós
mas mais sós do que ao estar sós.
Onde então estamos nós?
Nostalgia, de Florbela Espanca
Nesse País de lenda, que me encanta,
Ficaram meus brocados, que despi,
E as jóias que p’las aias reparti
Como outras rosas de Rainha Santa!
Tanta opala que eu tinha! Tanta, tanta!
Foi por lá que as semeei e que as perdi…
Mostrem-me esse País onde eu nasci!
Mostrem-me o Reino de que eu sou Infanta!
O meu País de sonho e de ansiedade,
Não sei se esta quimera que me assombra,
É feita de mentira ou de verdade!
Quero voltar! Não sei por onde vim…
Ah! Não ser mais que a sombra duma sombra
Por entre tanta sombra igual a mim!
Tenho Uma Saudade Tão braba, de Vitorino Nemésio
Tenho uma saudade tão braba
Da ilha onde já não moro,
Que em velho só bebo a baba
Do pouco pranto que choro.
Os meus parentes, com dó,
Bem me querem levar,
Mas talvez que nem meu pó
Mereça a Deus lá ficar.
Enfim, só Nosso Senhor
Há-de decidir se posso
Morrer lá com esta dor,
A meio de um Padre Nosso.
Quando se diz «Seja feita»
Eu sentirei na garganta
A mão da Morte, direita
A este peito, que ainda canta.
Estas 8 livrarias em Lisboa têm qualquer coisa de muito especial